João Pessoa, 04 de março de 2024 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
As aves que aqui gorjeiam, gorjeiam, sim, como lá. Aproprio-me do belo e famoso verso de Gonçalves Dias (foto), para falar de uma situação comum entre Brasil e Portugal, neste momento em que me encontro, na cidade de Coimbra, para um período de estudos. O leitor já deve ter entendido as referências aos dêiticos aqui e lá.
Quando me refiro ao gorjeio das aves, quero dizer que os problemas e as insatisfações são as mesmas, nos dois países, no que diz respeito ao tratamento dado à educação. O que vemos aqui, com muita frequência, é a manifestação de professores, reclamando dos salários e de uma carreira insatisfatória para a profissão. Os salários são baixos, em alguns casos, não passam do ordenado mínimo ou simplesmente ordenado, como se chama o salário mínimo em Portugal. Muitos professores, decepcionados e frustrados com o tratamento recebido, manifestam a sua intenção de deixar a profissão.
O salário mínimo aqui é da ordem de 750 €, algo em torno de $ 4.200,00, bem maior do que o salário brasileiro, nominalmente falando. Igualmente ao Brasil, no entanto, o que se recebe não dá para custear as despesas de uma pessoa, muito menos de uma família. Os preços até 31 de dezembro de 2023 eram um, a partir do início de janeiro de 2024, tudo aumentou. Percebe-se sensivelmente numa ida ao supermercado.
Tenho conversado com algumas pessoas sobre a situação dos professores portugueses e fiquei triste ao constatar que não se distancia muito da nossa. O que tenho lido nos jornais só confirma o que ouvi. Durante esta primeira semana de março, houve uma série de eventos, comemorando o Dia da Universidade. Na fala do Reitor da Universidade de Coimbra, uma das mais prestigiadas da Europa, idosa e respeitada senhora de quase 800 anos, tive a sensação de estar lendo não o Diário de Coimbra, mas um jornal qualquer do Brasil. Sua Magnificência se queixa de que, nos debates para as eleições deste ano de 2024, os candidatos silenciem sobre as questões cruciais da educação.
De um lado do Atlântico, o silêncio sobre a Educação, inegavelmente um dos pilares de sustentação de qualquer sociedade que tenha a intenção de avançar e de se modernizar; do outro lado, o desprezível discurso retórico, dos que acham resolver o problema da educação com palavras ou com medidas paliativas e viciantes. De qualquer modo, os gorjeios metafóricos, silenciosos ou espetaculosos, são semelhantes, no sentido de que todos evitam tratar do assunto estruturalmente. Omitir-se ou falar bobagens para uma claque imbecilizada e analfabeta, sem a menor noção do que seja o trabalho de um professor, tem um custo político muito menor.
Não me admirará se os mesmos de hoje sejam reeleitos logo mais. Aí, sim, será mais uma confirmação do mesmo canto, funesto, e das mesmas aves, aziagas.
(Este texto vai para o meu amigo, Sérgio Rolim Mendonça, que publicou recentemente um artigo sobre o Liceu Paraibano, revelando a decadência do ensino contemporâneo)
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TURISMO - 19/12/2024