João Pessoa, 07 de fevereiro de 2012 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Reduto da revolta conta o presidente Bashar al-Assad na Síria, Homs se transformou numa enorme jaula em que milhares de pessoas tentam tocar suas vidas em meio a bombas, dezenas de francoatiradores no topo dos prédios e um ambiente de terror generalizado e contínuo, suportando a feroz ofensiva das tropas do regime.
O ataque às áreas rebeldes começa normalmente às 6h30m da manhã. Nesta segunda-feira, por exemplo, choveram mais de 200 bombas sobre a população civil que, refugiada dentro de casa, carece do mínimo para se esconder. A morte pode surpreendê-los na sala, na cozinha, na porta da sala. Entre as 10h e o cair da noite, as bombas passam a cair de dez em dez minutos.
Sair à porta de casa é um ato suicida. Os poucos habitantes que tentam apertam o acelerador até o fundo, dirigem abaixados, evitando as avenidas principais e se esquivando dos constantes disparos.
Os francoatiradores são precisos, acertam quase sempre na cabeça ou na nuca. Quase todos os carros têm marcas de bala. Só os que transportam mortos ou feridos circulam, em geral nas primeiras horas da manhã. Os poucos pedestres que se arriscam andam colados nas paredes, tentando se proteger esporadicamente em alguma porta no caminho.
A tropas do regime cercam toda a cidade sem deixar saída. A brigada Al-Farouk do Exército rebelde está presente no interior, mas não pode fazer nada para frear a ofensiva, como conta Daniel Abu Dari, ativista sírio.
– As pessoas estão morrendo, precisamos de ajuda. Isso não é uma guerra civil. Nós lutamos com fuzis, e eles não nos atacam por terra, eles lançam bombas de vários quilômetros de distância – afirma Abu Dari. – É impossível parar o bombardeio, estamos totalmente desprotegidos.
Os furgões com feridos chegam a todo momento a um dos hospitais clandestinos de Homs. Nas pequenas salas de atendimento, se acumulam dezenas de feridos, alguns acompanhados de um parente que tenta de alguma forma ajudar. Não há médicos, só dois enfermeiros.
– É isso o que Bashar está fazendo – grita um deles, suplicando para que seu rosto não fosse fotografado.
Não há remédios e não é possível fazer operações. Há dezenas de corpos destroçados, alguns nem sequer identificados. Em uma das macas, estão tentando ajudar Khaled Abul Salah, conhecido no mundo árabe por ser o único sírio que transmite para redes de TV de sua língua com o rosto descoberto, explicando o que ocorre em Homs.
Como represália, as milícias do regime sequestraram seu irmão e o mataram há algumas semanas. No exterior do prédio, os cadáveres são cobertos por um pano branco, amarrado nas extremidades com uma corda. Depois, são levados por um caminhão.
A maioria das vítimas são civis, moradores que não dormem à noite pensando o que será de sua vida nos dias seguintes.
– Depois do veto de Rússia e China na ONU, Assad tem permissão para matar, como animais numa ratoeira – afirma Maryam, professora de escola primária de 40 anos. – Para que? Só queremos liberdade, nada mais que isso.
As famílias evitam subir aos andares mais altos e se refugiam nos quartos que consideram mais seguros, longe das janelas. O combustível para os aquecedores já começa a faltar, e as temperaturas são muito baixas. Há cortes de luz durante várias horas, e as linhas telefônicas e de internet não funcionam.
Em frente ao hospital, 13 pessoas se apertam em um quarto onde ainda há calefação.
– Está acabando, não temos mais combustível – diz um pai de família, rodeado pelos três filhos pequenos.
A avó se levanta e mostra um pedaço de pão: – É o último que temos.
A geladeira e a dispensa estão vazias. Eles assistem na televisão à cadeia Orient Express, a única dedicada exclusivamente às revoltas, mostrando um vídeo com caricaturas de Assad como se fosse uma girafa – uma brincadeira com o formato de seu pescoço.
Nas mesquitas, os alto-falantes transmitem durante toda a manhã cânticos e rezas muçulmanas. A professora Maryam diz que não lhes resta alternativa.
– Só podemos rezar, estamos nas mãos de Alá – diz.
O Globo
OPINIÃO - 22/11/2024