João Pessoa, 05 de maio de 2024 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Numa época em que, infelizmente, é notória a inversão de valores, o apego desmedido aos bens materiais, manifestações de dedicação e solidariedade ao próximo devem ser sempre lembradas.
Hoje, 5 de maio, marca o cinquentenário de falecimento de João Medeiros, um apóstolo de uma vida dedicada à criança e ao próximo – numa alusão Osías Gomes -, e permitam-me também, assim o dizer, com a convicção de quem testemunhou episódios marcantes de sua existência e relatos de amigos e pacientes contemporâneos de sua labuta diária.
Graduado, com muito esforço, pela Faculdade de Medicina da Bahia, em 1927, na vetusta escola do Terreiro de Jesus, o berço do ensino médico no Brasil, fora instado a interromper o curso por dois anos, a fim de trabalhar na alfândega da capital baiana, para manter-se, uma vez que seu irmão mais velho, e mais adiantado, Jacinto, que estudava no Rio de Janeiro, fora priorizado pelo pai, já que seus parcos recursos financeiros não permitiam manter os estudos dos dois filhos, simultaneamente, longe da Parahyba do Norte.
Retornando à terra natal dedicou-se com afinco à prática médica, atendendo pobres e ricos indistintamente, numa época em que a assistência pública era muito precária e, como já mencionei anteriormente, o atendimento dos chamados indigentes ficava à mercê das instituições filantrópicas e dos profissionais de bom coração, uma vez que a assistência universal somente passaria a vigorar a partir de 1988, com a criação do Sistema Único de Saúde, o SUS.
Atendia crianças e adultos, e nos idos de 1940, passou a dedicar-se à Pediatria, especialidade que abraçou com muito amor, cujos conhecimentos haveria de transmitir a uma grande legião de discípulos – muitos dos quais labutaram e labutam com muita competência, aqui e alhures -, quando da instalação da Cátedra de Pediatria na Universidade da Paraíba, da qual foi o fundador e titular.
Mesmo assim, os antigos pacientes nunca o abandonaram, e frequentemente era convocado para opinar sobre casos mais complexos nas chamadas juntas médicas. Em seu consultório, além de um belo quadro que reproduzia uma escrava, ama de leite, amamentando o filhinho do patrão, havia a pintura de uma caricatura sua, presenteada por um paciente, com os dizeres: “Dr. João Medeiros, pediatra de 0 a 80 anos”.
Desde logo, instalou um consultório na cidade baixa, na rua Maciel Pinheiro, para o atendimento exclusivo e gratuito, dos mais carentes.
Nesse contexto, há um fato notório, do qual tomei conhecimento:
Certo dia, sua atendente, adentrou o consultório ( não havia interfone), e meio aflita disse: “Dr. João, chegou há pouco um cidadão mau encarado pedindo para falar com o senhor”; ao que ele de imediato respondeu: “Mande-o entrar”.
O visitante sentou-se e , desde logo, afirmou: “Doutor, o senhor não me conhece, mas minha esposa Maria vem frequentemente trazer meus filhos Zezinho, Pedro e Maria de Fátima, e ela sempre menciona seu carinho com eles , inclusive sempre oferecendo os remédios. Sou muito grato ao senhor; acabei de sair do presídio do Roger, e antes de ir para casa, resolvi vir aqui agradecer ao senhor e, ao mesmo tempo, oferecer meus préstimos”.
João Medeiros, sensibilizado com o sentimento de gratidão daquela pessoa humilde e provavelmente analfabeta, mas , ao mesmo tempo, desconcertado com a proposta descabida, respondeu em tom de brincadeira: “Por falar nisso, estou até precisando que você me faça um servicinho “
Ao que o visitante respondeu: “Pois não doutor, mande as ordens”……
*Pediatra e Acadêmico Titular da APMED
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TURISMO - 19/12/2024