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“Eu aprendi a gostar de mim, como gostava dos outros”, é assim que começa o documentário “Dorival Caymmi – um homem de afetos”, de Daniela Broitman. Isso dele dizer “gostar de mim”, é o retrato do amor. Em outro movimento, ele diz que era bonito.
Caymmi traz a música do mar para dentro de nossa casa, a canoa, os pescadores, os peixes e os amores: Marina, que ele pede que ela não se pinte, que já é bonita com o Deus lhe deu; Gabriela e seus camaradas.
Tanta coisa linda, a canção de ninar “Acalanto” que ele fez para a filha Nana Caymmi: “é tão tarde, a manhã já vem, todos dormem, a noite também, só eu velo, por você, meu bem”. No documentário, o registro do tempo mostra o afastamento entre pai e filha, cerca de 7 anos.
E ainda por cima, Caymmi é humilde. É isso mesmo, Caetano Veloso também é o retrato de Dorival Caymmi, ao dizer que ele é o maior de todos. Isso Caetano diz no documentário e repete a vida inteira.
“Dorival Caymmi – um homem de afetos” é um documentário amoroso, sobre a obra de um compositor amoroso, com relatos de amigos e artistas, Gilberto Gil, Caetano Veloso, Guto Burgos – dos filhos Nana, Dori e Danilo, daqueles que conviveram com o artista.
O longa aborda o processo de criação de suas maiores obras e, como elas impactaram na história da música brasileira, incluindo a vida da cantora Carmen Miranda, que se tornou um fenômeno ao gravar pela primeira vez uma das músicas do mestre, “O Que é Que a Baiana Tem?”!
É significativa a imagem da secretária Cristiane dizendo que a pedido de Stella Maris, que morreu antes de Caymmi – ele não soube), que ela ficasse junto dele na hora final. “Eu fiquei e ele não percebeu que se foi”. Stella Maris morreu aos 86 anos, 11 dias após a morte do marido, Dorival Caymmi em agosto de 2008. Ela estava internada no Hospital Pró-Cardíaco, em Botafogo, Zona Sul do Rio. Ou seja, nenhum soube do outro.
Caymmi traz a música da Bahia, do Senhor do Bonfim, da Mãe Menininha do Gantois e dos orixás que nos aquece e nos ensina a chamar o vento. Vamos chamar o vento, vamos chamar o vento.
Seus versos são de uma suavidade, como a contemplação do mar e coisas simples, grandiosas, pelo seu cantar, como se Caymmi falasse com a gente, quando pergunta a “Você já foi à Bahia, nega?” Tem-se a impressão que Caymmi não canta, e ele fala cantando.
O filme é lindo, com esse viés, que veio traz o vento. Ele explicando esse vento, e só ele, com aqueles gestos todos enervando o vazio das horas inquietantes. Caymmi é belo. “Dorival Caymmi – um homem de afetos” não é um filme tardio, mas necessário, com arquivos e imagens inéditas, coisas que nunca foram vistas pelo público.
Cenas lindas, a risada de Caymmi, o homem sanguíneo, a volta dos pescadores que tem 2 amor, um na terra, outro mar, que sequer levantam sobrancelhas ou interrogam esses amores, um na terra, outro no mar.
Gil canta Caymmi, Bethânia canta Caymmi, Caetano canta Caymmi e Gal gravou um disco inteiro cantando Caymmi, em 1976. Sinais, notícias de Pedro, Maurino, Dadá e Zecô que embarcaram de manhã, era quarta-feira santa, dia de pescar e de pescador…
Caymmi das marés com Rosa, morena rosa, Dora, das pontes colônias do Recife, da vizinha que passava com seu vestido grená, Caymmi cantado por Sarah Vaughan, Caymmi, Caymmi, e tudo que a Bahia tem… a Bahia tem jeito, Terra, Terra…
Kapetadas
1 – Não é estranho a pessoa pôr panos quentes pra esfriar a situação?
2 – Aos 82, já estava na hora do McCartney sossegar o baixo.
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OPINIÃO - 22/11/2024