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Jornalista paraibano, sertanejo que migrou para a capital em 1975. Começou a carreira  no final da década de 70 escrevendo no Jornal O Norte, depois O Momento e Correio da Paraíba. Trabalha da redação de comunicação do TJPB e mantém uma coluna aos domingos no jornal A União. Vive cercado de livros, filmes e discos. É casado com a chef Francis Córdula e pai de Vítor. E-mail: [email protected]

A gata de Gullar

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publicado em 14/07/2024 às 08h17
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Há um longo tempo na leitura do “Poema Sujo” que Ferreira Gullar escreveu em Buenos Aires em 1976, quando estava exilado. São mais de dois mil versos criados na solidão do exílio, uma espécie de fala da memória, mas o tempo é outro, ligando entre si os pensamentos nossos, que se desdobram em formulações novas.

Tudo escapa dos olhos. O gato, por exemplo, espera o homem que por ele se interroga sem cessar. Você gosta de gente?

O poeta Ferreira Gullar escreveu vários poemas sobre os gatos – “Dizem que gato não pensa, mas é difícil de crer. Já que ele também não fala como é que se vai saber? Ele criava uma gata em seu apartamento em Copacabana,  acho que a última, antes de partir, que se escondia quando ele chegava da rua. Muita gente prefere os cachorros.

Escrever simples não é fácil, já que não sabemos, nem tentativas sobre a forma haikai que abunda, que não é mais bonito que uma Quadrinha, mas a palavra bunda é bonita – e dobra o prazer de ler e interpretar (divagar pode) os significados sugeridos pelo tempo do “Poema Sujo” de Gullar

Conversava com um amigo, na calçada da praia, ele falava que a pior pancada humana está em olhar para trás e ver o tempo que perdeu, se perdeu, se teve tempo não fez  a construção da vida.

Não se perde tempo com o amor de um animal, seja ele gato ou cão. Perder tempo, daqui pra frente, não é nada bom. Se a pessoa chega a velhice e não construiu nada, ela continua presa a prenda de si mesma.

Não se deve brincar com o tempo, não se deve perder tempo com quem já está noutro tempo, ou com quem dialoga com a violência verbal. O tempo dirá – o tempo melhora ou piora tudo.

Não somos Proust

Há em mim uma ânsia de viajar em Proust, um escritor que observou e descreveu a vida num tempo em que não foi perdido, creio, mas o que penso e falo, não tem importância.

O tempo redescoberto de Proust tem como limiar o extra – temporal ou atemporal, primeiro, em virtude da fugidia contemplação, também, a necessidade de focar nas descobertas, de um ser extra, quando não se é extraordinário. É complicado.

Não se tem noticia que Proust tinha um gato.

Ainda há tempo de entender que “Em busca do tempo perdido” apresenta um mundo fictício, claro, desdobrado em dois tempos: tempo perdido e tempo redescoberto. E só isso explicaria, mas como a gente consegue brincar com o tempo, se não estamos atentos  as respostas do tempo?

O  tempo redescoberto por Proust traz descobertas da vocação para ele, que o próprio Proust anuncia: “aquela  ausência de gênio, aquele buraco negro que se abria em meu espirito quando eu buscava o assunto dos meus futuros escritos, não era  mais que uma ilusão sem consistência”. Está lá “NoCaminho de Swann

Lembro das frases longas de Proust, sem virgulas, da genialidade do tempo da Sombra das Raparigas em Flor.

O que Gullar tem a ver com Proust? Nada, eu apenas mudei de assunto.

Kapetadas

1 – Os pontos fortes de um poeta são seus pontos fracos.

2 – A Inteligência Artificial será mais útil quando, em vez dar respostas, se fizer perguntas.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB