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Francisco Leite Duarte é Advogado tributarista, Auditor-fiscal da Receita Federal (aposentado), Professor de Direito Tributário e Administrativo na Universidade Estadual da Paraíba, Mestre em Direito econômico, Doutor em direitos humanos e desenvolvimento e Escritor. Foi Prêmio estadual de educação fiscal ( 2019) e Prêmio Nacional de educação fiscal em 2016 e 2019. Tem várias publicações no Direito Tributário, com destaque para o seu Direito Tributário: Teoria e prática (Revista dos tribunais, já na 4 edição). Na Literatura publicou dois romances “A vovó é louca” e “O Pequeno Davi”. Publicou, igualmente, uma coletânea de contos chamada “Crimes de agosto”, um livro de memórias ( “Os longos olhos da espera”), e dois livros de crônicas: “Nos tempos do capitão” …

Esses gostos simples

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publicado em 09/08/2024 ás 07h00
atualizado em 08/08/2024 ás 20h03

 

Tenho em mim um sopro efervescente, ígneo magma em convulsão. Nasceu inocente quando minhas placas tectônicas eram uma só pangeia, uma folha em branco, apenas um traço de distinção: eu e os outros.

No início, o outro era minha mãe, dizia-me o cordão umbilical (foto), ponte tênue que me ligava a ela e dela me distinguia. Quando eu queria algo, chutava o seu ventre e ela sempre me dava seus gostos e suas possibilidades.

Não me vem à mente quando suguei seu leite, mas há uma lembrança vaga dos seus cabelos pretos, um leito volumoso com cheiro de sabão de coco por onde eu escorregava meus olhos arregalados e matava a minha fome de beleza e segurança.

Depois que o tempo recrudesceu as nossas diferenças, restou-me o seu cafuné. Cafuné é algo milagroso que faz a gente dormir e sonhar, sobretudo o dela que tinha gosto de chá de erva cidreira com um torrão de açúcar afogado em uma xícara de café. Às vezes, pão doce dentro.

Os gostos de minha mãe… Tão simples!

Alguém aqui já comeu farinha com café? Banana com farinha é bom, mas manzape de milho é bem melhor. Lá em casa, farinha era como essas coisas universais. Misturada com dois ovos cozidos. Minha mãe lambia os beiços, mas tinha uma coisa que ela não dispensava: baião de dois com farofa feita do caldo de um capão daqueles de traseiro amarelado arrastando pelo chão pela comida farta do chiqueiro. E muita cebola roxa.

A fruta preferida de minha mãe era manga. Os vestidos eram longos e coloridos. O programa radiofônico “Terreiro da Fazenda” fazia minha mãe dançar pela sala como essas rajadas de vento que não se importam com o destino. O oratório azul claro era adorado religiosamente. Um pedaço de vela e seu cheiro adocicado, a reminiscência da última novena para São José.

Mas a morte soprou o seu destempero e fúria no meio dos olhos cegos da minha mãe. Minha mãe, pela vida, se fez guerreira destemida, mas o tempo que estava encalacrado em suas costas pendeu para o lado desse rio caudaloso que engole todos nós. Às suas margens retorcidas, ainda remo as pás do tempo. Ainda sou córrego efervescente, ígneo magma na plenitude da solidão. O que será dos afluentes de um rio grandão que se evapora?

@professorchicoleite

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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