Quando o professor Milton Marques Júnior retornou de Coimbra, onde passou dez meses na companhia de sua esposa Alcione, cuidei dos preparativos para seu reencontro com o tamarindo por ele plantado nos jardins da Academia Paraibana de Letras.
Durante a ausência de Milton, fiquei como guardião silencioso a observar o símbolo da poesia de Agusto dos Anjos plantado pelo meu amigo por ocasião de sua posse na Academia, representando o florescimento de outra paisagem mística no Jardim dos Acadêmicos, porque o sumo poeta está perpetuado no museu onde estão alguns pertences e cópias de seu livro.
Em homenagem ao mestre confrade e ao poeta, abracei a árvore que crescia no recanto do jardim da Casa do Saber da Paraíba, a quem servia com prazer porque estava perto dos símbolos reveladores da magia da alma.
A terra do antigo engenho Pau D’arco copulou a semente que despencou do tamarindo, fecundou e fez brotar o símbolo que veneramos, trazido pelo professor. A muda que o confrade trouxe, aos nossos olhos, cresceu com o aguo diário e o sereno na noite. Durante todo esse tempo a árvore olhava para cima, carregando a beleza de sua ancestralidade que encantou o poeta Augusto.
A sombra do poeta maior estará em nossa Academia, como também em Leopoldina (MG), nas ruinas do engenho Pau D’arco e no busto existente na lagoa do Parque Solon de Lucena, resistindo às intempéries. Mas sobretudo, nas bibliotecas pelo Brasil afora.
Durante este período em que o Milton esteve em Portugal, a árvore cresceu ouvindo os gemidos da poesia espalhada pelos corredores e jardim da Academia.
Durante sua ausência, amigo, o tamarindo deu sinais de que se refrescava com a brisa das noites. No fulgor do sol tropical das manhãs, enquanto era untado com os chuviscos saídos do regador, percebíamos os acenos das folhas respingando poesia.
Em alguns momentos percebia que a árvore aquietava os sismos do meu mundo interior, fazia pequenos registros em caderneta lembrando do amigo distante e do poeta que imortalizou sua sombra, sentindo uma reação frontal despertada em mim para cada vez mais cuidar desta preciosidade, somente amputando os galhos desnecessários para o crescimento saudável.
Em alguns momentos, junto aos seus galhos, parecia sentir os versos de Augusto, e cansado, lembrava da vida solitária e distante de minha terra. Cuidava do pequeno tamarindo como a manusear o livro de Augusto, revivendo minha vocação de silvicultor que deixei em Serraria, onde, como em uma festa, sentia a música do vento nas árvores. Minha fúria arborícola nunca esmoreceu desde quando deixei meu sítio, pois, nesses dias, foi alimentada no manuseio da terra para fazer crescer a muda da árvore do poeta.
Neste lugar onde floresce a alma de Augusto, não ficará apenas a sombra do poeta, mas a sua presença estará perpetuada graças a iniciativa de Milton Marques Júnior, e crescerá aos afagos de nossas mãos.
Milton, em suas mãos entrego o fruto do seu afeto pela poesia e pelo poeta maior, objetivo de apreço que conduziu ao espaço da amizade a unir você, o poeta e eu.
Na tarde, depois de tanto tempo afastados, quando o professor olhou para o tamarindo tocando suas folhas, seus olhos brilharam semelhantes aos raios solares que desciam por entre os galhos do pau-d’arco e outras árvores também existentes no jardim da Academia. Esse reencontro teve o registro na alma para se perpetuar na memória.
Você não cuidará sozinho deste símbolo da poesia universal de Augusto, mas nós estaremos juntos porque a sombra do poeta sempre estará nos jardins de nossa Academia.
Quem sabe, professor, vendo crescido este tamarindo, longe da “dor da força cósmica furiosa”, tenhamos “uma velhice calma”, porque esta árvore possui a nossa alma.