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Poeta, escritor e filósofo. Nasceu em Pombal no ano de 1961. Reside em João Pessoa

                 A CANÇÃO DE ROLANDO

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publicado em 13/10/2024 ás 15h47

A Canção de Rolando é um poema épico composto no século XI em francês antigo, sendo a mais antiga das canções de gesta escrita em uma língua românica. Teve enorme influência na Idade Média, inspirando muitas obras sobre o tema (a chamada Matéria de França) por toda a Europa. Como outras canções do gênero, à época, era recitado por jograis nas cortes e nas cidades.

O poema narra o fim heroico do conde Rolando, sobrinho de Carlos Magno, que padece junto ao seus homens na batalha de Roncesvalles, travada no desfiladeiro do mesmo nome contra os sarracenos. A batalha histórica do poema é uma batalha real, ocorrida em 15 de agosto de 778 entre a retaguarda do exército de Carlos Magno, sob o comando de Rolando, um dos Doze Pares de França, que abandonava a Península Ibérica e um grupo de montanheses bascos, que a chacinou.  Embora tenha por base uma batalha cuja ocorrência é corroborada historicamente, o relato apresentado no poema não é muito fidedigno: os autores do massacre passaram de bascos a mulçumanos e tanto essa alteração como o tom geral do poema justifica-se pelo contexto das Cruzadas e da Reconquista cristã da Península, que presenciou no século XI.

Existem vários manuscritos medievais da Canção de Rolando em francês antigo, um dos quais escrito na variante anglo-normanda. Este último, conservado da Biblioteca Bodleiana de Oxford, é o mais antigo de todos e data de entre 1130 e 1170. Acredita-se, porém, que a primeira versão do poema possa ter surgido antes, derivada da tradição oral sobre a batalha de Roncesvalles. Aparentemente, uma das finalidades da narrativa da história de Rolando era a de moralizar os exércitos antes das batalhas. Nas obra de Guilherme de Malmesbury (Gesta Regum anglorum – as façanhas dor reis ingleses) há referência a um poema sobre Rolando recitado antes da Batalha de Hastings, que conduziu à conquista normanda da Inglaterra por Guilherme da Normandia em 1066. O autor do poema nunca foi identificado.

No poema o imperador franco Carlos Magno luta contra os sarracenos (mouros) há sete anos na Espanha, mas uma praça ainda resiste: Saragoça, administrada pelo traiçoeiro rei Marsilio. Marsilio e os seus nobres, certos de que a derrota é inevitável, desenvolvem um plano para ludibriar os francos. Enviados de Marsilio prometem que ele será vassalo de Carlos Magno e que se converterá ao cristianismo, uma vez que o imperador tenha partido da Espanha. Mas o rei sarraceno não pensa em concretizar o prometido: tudo não passa de um plano rigorosamente elaborado de modo a fazer com que os francos saiam de seu território.

Carlos Magno e os seus vassalos estão cansados da guerra e não confiam na palavra de Marsilio. Entre eles estão o conde Rolando, sobrinho do rei, Oliveiros, amigo de Rolando e Ganelão, padrasto de Rolando. Rolando aconselha a não confiar em Marsilio, enquanto Ganelão quer pôr termo à guerra, já. Os conselheiros do imperador decidem então enviar uma embaixada a Saragoça, uma empreitada perigosa porque Marsilio já havia matado enviados anteriores. Vários cavaleiros se oferecem, inclusive Rolando, mas o imperador não lhes consente. Então Rolando sugere Ganelão como embaixador e o rei concorda. Isso aumentou o terrível ódio que Ganelão sentia contra Rolando.

O poema está composto por 4002 versos agrupados em 290 estrofes. As estrofes tem um número irregular de versos, comuns na poesia francesa medieval e chamada laisses (trelas). Os versos são decassilábicos (dez sílabas), sem rima mas com o emprego da assonância, ou seja, de repetição de vogais com sons semelhantes nas sílabas tônicas dos versos de uma mesma trela. Em todos esses aspectos a Canção de Rolando é uma típica canção de gesta francesa.

O autor usa muitos paralelismos e repetições, contando e recontando algumas cenas de ângulos um pouco diferentes. Em geral a narrativa é rápida, mas algumas passagens são contadas em muito detalhe. Quase não há descrição psicológica dos personagens, que são caracterizados mais por suas ações do que por suas reflexões. Muitas vezes o autor antecipa, muitas estrofes antes, eventos do futuro, por exemplo a traição que sofre Rolando e a execução de Genelão no final.

Alguns personagens da Canção de Rolando:

Carlos Magno, à data dos eventos apenas ainda Rei dos Francos, dos Lombardos e dos germanos; os seus exércitos combatem os sarracenos na Espanha. Rolando, o herói da canção; sobrinho de Carlos Magno, lidera a retaguarda dos seus exércitos à saída de Espanha; morto pelas forças de Marsilio após valente peleja.

Ganelão (Genelon), o traidor que encoraja Marsilio a atacar os francos.

Marsilio (Marsile), rei mouro de Saragoça, na Espanha; é ferido por Rolando, vindo a morrer mais tarde devido a esse ferimento.

Oliveiros (Olivier), o amigo íntimo e prudente de Rolando, morto na batalha.

Bramimunda, Rainha de Saragoça, capturada por Carlos Magno e convertida ao cristianismo.

Concluindo com o décimo verso da Canção de Rolando:

O imperador mantém a cabeça abaixada. Jamais sua palavra foi apressada; tal é seu costume, ele fala com calma. Quando se ergueu, seu rosto exprimia uma imensa altivez. Ele disse ao mensageiro: “Falastes bem. O rei Marsilio é meu grande inimigo; em que medida poderei estar seguro das palavras que acabastes de pronunciar? – “Pelos dez, quinze ou vinte reféns que tereis”, disse o Sarraceno. “Eu enviarei um filho meu ainda que ele possa perecer, e, creio, recebereis outros ainda mais nobres. Quando estiverdes em vosso palácio senhorial, na grande festa de São Miguel do Perigo, meu senhor afirma que vos encontrará lá. São nas águas termais que Deus fez para vós, que ele quer tornar-se cristão”. Carlos responde: “Ele ainda pode ser salvo”.

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