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A tradição é que esses pares, cavaleiros que formavam uma espécie de tropa de elite do imperador Carlos Magno, eram doze e assim se fixa o seu número no primeiro poema que celebrou a batalha de Roncesvalles – La chanson de Roland (A canção de Rolando), quando se procura escolher no Conselho do Imperador um embaixador ao rei Marsílio, de Saragoça, e quando o próprio Carlos Magno diz: – “Par cette barbe que vou vouuez toute blanche, je defend qu’on choisisse aucun des douze pairs”. (Por essa barba que você vê toda branca eu defendo que escolhamos qualquer um dos doze pares).
E na tradição nordestina dos cantadores e poeta de bancada foi feita a devida fixação do número dos doze pares de França:
“Você falou-me em Roldão
Conhece dos cavaleiros
Dos Doze Pares de França
Dos destemidos guerreiros
Falarás alguma coisa,
De Roldão mais Oliveiros…
“Eram doze cavaleiros
Homens muito valorosos
Destemidos, animosos,
Entre todos os guerreiros
Como bem fosse Oliveiros
Um dos Doze de fiança
Que sua perseverança
Venceu todos os infiéis
Os doze leões cruéis
– Os doze Pares de França”
Nas Cavalhadas de Pirenópolis, Góis e em Alagoas correm doze cavaleiros e é sobretudo da tradição que esse cavaleiros representam os doze pares de França, tanto assim que cada um deles traz a tiracolo uma faixa com um dos nomes dos doze pares, segundo a tradição local. São eles: Roldão, Oliveiros, Ricarte de Normandia, Gui de Borgonha, Guarin de Lorena, Lamberto de Bruxelas, Urgel de Danoá, Bosin de Gênova, Hoel de Nantes, Tietri de Dandânia, Nemé da Baviera e Duque Regnier. Mas às vezes o nome do último par, Duque de Regnier, é substituído por outro, o de Gerardo de Mondifer. Na tradição das Cavalhadas de Mouros e cristãos – os cavaleiros cristãos são em número de doze. Os cavaleiros cristãos têm por chefe o próprio Carlos Magno; então, o número dos pares de França não passaria de onze, uma vez que Carlos Magno não é um dos pares. Pela lógica deveriam lutar, preliar os doze pares e mais o imperador, num total de 13 cavaleiros.
Os Doze Pares de França foi traduzido do espanhol para o português, era considerado o grande livro de história para as populações do interior do Brasil. Nele espelhava-se a velha cavalaria andante com seus lances de heroísmo incrível e de audácia sobre-humana. Os cantadores aproveitavam-se abundantemente do repositório de andanças inverossímeis de guerras inacabáveis e imaginárias. Carlos Magno, Roldão, Oliveiros, os duques, mouros, reis bárbaros, corriam e até hoje correm de memória em memória numa continuidade de admiração profunda.
Essa história de Carlos Magno, de proezas extraordinárias e valentias, só são comparáveis às dos cangaceiros e cowboys cinematográficos, nada tem de real nem de possível. É um tecido de lendas assombrosas, convergência de algumas dezenas de gestas francesas, reunidas, confundidas e sobrepostas, outrora pertencentes à vários heróis lendários. Aparece, como chefe supremo dos mouros inimigos de Carlos Magno, o Almirante Balão (Balaão) que já surgira no romance de Flor e Blancaflor, como o todo-poderoso almirante de Babilônia e ao passar por Castelha, arrebanhou um gigante Ferrabrás – seu filho, e trouxe, como apêndice indispensável, às façanhas de Bernardo del Cáspio. A mais popular dessas histórias do ciclo carlovíngio era a do espanhol Nicolau de Piemonte que reunira várias tradições, fazendo um verdadeiro rosário aventuroso do grande rei dos francos.
A versão espanhola, vinda do original de França, o português Jerônimo Moreira de Carvalho, físico-mor no Algarve, doutor em medicina, calcou sua tradução que publicou em Lisboa, em 1728, e a segunda em Coimbra, 1732, já com 339 páginas que foram consideradas complicadíssimas. Surgiu posteriormente em Lisboa, 1737 nova tiragem, com uma segunda parte e tendo por subtítulo: “Fielmente tirada das crônicas francesas”. Sucederam-se outras, já reunidas as duas partes e a edição conhecida no sertão vem da portuguesa de 1814. São todas em prosa. Os poetas sertanejos, obrigados pela cantoria, passaram alguns episódios para as costumeiras sextilhas, a prisão de Oliveiros, a luta de Ferrabrás e mesmo um resumo da biografia do Imperador Carlos Magno. (Câmara Cascudo).
Ferrabrás, o guerreiro turco, com cavalo, espada e lança, chega à Europa e, aos gritos, desafia os Pares de França. Oliveiros, cansado e ferido de lutas, é o escalado para a contenda bruta, que até hoje o povo comenta e canta. Versão de Leandro Gomes de Barros:
Eram doze cavaleiros
Homens muito valorosos,
Destemidos e animosos
Entre todos os guerreiros,
Como bem fosse Oliveiros,
Um dos Pares de fiança,
Que sua perseverança,
Venceu todos os infiéis –
Eram leões cruéis
Os Doze Pares de França!
Todos eram conhecidos
Pelos Leões da Igreja
Pois nunca foram à peleja
Que nela fosse vencidos.
Eram por turcos temidos,
Pela igreja estimados,
Porque, quando estavam armados,
Suas espadas luziam
E os inimigos diziam:
– Esses são endiabrados!
Tinha o duque Nemé,
Que era uma espada medonha,
O grande Guy de Borgonha,
Geraldo de Monde fé
Em todo os cavaleiros,
Pois, entre todos guerreiros
De que nos trata a história,
Vê-se sempre a vitória
De Roldão e Oliveiros.
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Ciência e Tecnologia - 29/11/2024