João Pessoa, 12 de novembro de 2024 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Começando a andar, já ouvimos alguém dizer: “Olha ali, seu coleguinha já está andando e você não”. Depois você escuta : “seu coleguinha já está andando de bicicleta, já terminou o ensino fundamental, o ensino médio, a universidade, já casou, tem um carro, tem um bom emprego, tem filhos e você não”. Durante esse período se instala no seu consciente uma fala de cobrança e de comparação com o outro que possui um DNA diferente do seu, um biótipo, genética e trajetória de vida totalmente diferente da sua. São os primeiros passos na caminhada da vida que já começam a nos avisar que o que vem pela frente será uma construção de identidade comparativa, onde um indivíduo se compara com o outro para poder existir e tentar fazer sentido sua própria existência.
Na escola a comparação é praticamente um sacramento pedagógico, seja direto ou indireto, mas há o tempo todo um “vigilante” ou uma “vigilante” do seu desempenho escolar e acadêmico, que pode ser um professor, ou uma professora, um diretor, ou uma diretora, um inspetor ou uma inspetora, um pai, uma mãe, um tio, uma tia, ou os exames de avaliação continuada que “servem para avaliar” o “rendimento” daquele aluno ou daquela aluna que frequenta a escola diariamente, ou também se tiver baixa assiduidade, não se socializar com os coleguinhas de sala ou que tenha algum laudo ( aqueles diagnósticos que muitas vezes diagnostica alguém que nada de transtorno tem, apenas má educação mesmo…rs).
A comparação na escola é uma metodologia muito normalizada, mesmo sem perceberem que essa prática influencia a competitividade e um comportamento indiferente à solidariedade e ao companheirismo. Muitos profissionais da educação defendem que a competição é uma motivação saudável e que impulsiona os estudantes a serem melhor uns aos outros e até a ganhar uma medalha por ser aluno nota 10. Medalha esta que infla o ego do ganhador e o faz se sentir superior aos demais, e….simultaneamente dispara o gatilho da comparação naqueles que ficaram fora do pódio da vitória, e no último lugar, onde ninguém olha, fica a a utopia de uma escola sem violência, sem racismo, sem lgbtfobia e construtora da paz. Porque não se faz paz com competitividade, assim como todo o princípio de guerra é o acirramento da competição, seja econômica, territorial, étnica ou religiosa.
Em muitas religiões a comparação é uma pedagogia que deve ser ensinada, e pregada, embora que muitas vezes não seja praticada, mas o que importa mesmo é usar a comparação para adjetivar salvos e perdidos, justos e ímpios, abençoado e sofredor, santos e pecadores. E pela comparação se estabelece um grau, um tipo de nível que se deve atingir e chegar, sem se importar se essa meta custa a saúde mental ou não. A comparação é uma espécie de poder disciplinar e de vigilância, e através desses dispositivos de controle mental os indivíduos seguem suas vidas como se tudo fosse um fato natural e determinado por uma ordem e um sistema divino. Mesmo que essas pessoas não deixem de comparar o jardim, a casa, o apartamento, o carro do vizinho e o corpo do outro, elas não se dão conta que estão todas condicionadas a um modo de vida que sistematiza a comparação como mecanismo de poder, e manipulação coletiva. Também pudera, as pessoas estão ocupadas demais em seus empregos, competindo com o colega para ter um salário e um cargo melhor, estão gastando o pouco salário que recebem para comprar itens que o outro tem, empenhando suas horas de vida em torno de um espelho que nunca reflete a verdadeira imagem de si, mas que sempre mostra o outro como o melhor, o mais inteligente, o mais chic, o mais viajado etc. E nunca o reflexo real de quem são, das potencialidades que possuem, da singularidade que são e de quão única são num planeta povoado por bilhões de outro seres humanos.
Desde muito cedo, o sistema tem nos ensinado a nos comparar com o outro, como uma espécie de estratégia de dar sentido a nossa existência. De construirmos significados nossos a partir do modo de ser, e de viver do outro, que pode massagear o ego ou assassinar nossos sonhos, e muitas vezes potencializar o medo ao tamanho de uma bomba nuclear de milhões de megatons.
A comparação tem adoecido muita gente. Desfeito relacionamentos. Destruído carreiras e jogado milhões de seres humanos na depressão e no alheamento da vida real.
Temos vivido tempos de consultórios psicológicos lotados, de abuso de ansiolíticos, psicotrópicos de toda ordem, simplesmente pelo fato de muita gente estar vivendo sob a corrente da comparação, se torturando diariamente por não ser igual aquele seu próximo, a não ter o que o outro tem e não estar no lugar que ele está. Infelizmente esqueceram que cada um é uma história única, um ser humano sem cópia, e que viver é fazer sua própria história única, singular e mais autêntica possível.
Façamos nossa trajetória sem comparação, e sem se incomodar com o outro, porque como diz a canção Gente Feliz: “ Gente feliz não se incomoda com os outros, cada um tem sua maneira de existir”
Façamos nossa vida mais feliz.
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OPINIÃO - 22/11/2024