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Poeta, escritor e professor da UFPB. Membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

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publicado em 29/01/2025 ás 07h00
atualizado em 29/01/2025 ás 08h48

A APL, Academia Paraibana de Letras, ou Casa de Coriolano de Medeiros, como queiram, se simboliza o culto da memória e a preservação dos valores culturais do passado, não se mostra indiferente às solicitações do presente. Através de alguns de seus sócios efetivos, por exemplo, mantém viva a chama do debate em colunas assinadas no vetusto periódico oficial, trazendo à tona o patrimônio das ideias, a relevância dos fatos e a presença incontornável de personalidades que se destacam no mundo das letras, das ciências e das artes.

Acompanho meus pares sempre com interesse na aventura e na rotina da leitura, tentando captar os sinais semânticos de cada texto, atento, dentro de meus limites, aos sortilégios da gramática, às artes da retórica e ao poder da dialética que os municiam, nas suas configurações de artigo, crônica, crítica, ensaios etc.

Gonzaga Rodrigues, na altura de seus noventa e tantos anos, é o carro chefe da crônica, no seu itinerário ao mesmo tempo lírico e social. A cidade, em suas múltiplas facetas urbanas, divide, com o sítio da infância, os percursos temáticos de sua escrita criativa, a funcionar, qual um contraponto melódico, com o pragmatismo da redação jornalística. Digamos que sua crônica é aquele balneário que nos convida para o repouso e para o devaneio, certos de que, em sua pequenina paisagem, experimentamos o ouro primeiro dos elementos naturais.

Quando não desenvolve certos assuntos ao ritmo do artigo, José Nunes tangencia esse sacrário verbal que é a crônica, sobretudo, se os motivos lhe chamam por trás das serras úmidas de Serraria. Brejeiro, como Gonzaga, aqui e ali, sua frase parece banhada nos riachos cristalinos daquela topografia gizada com os ventos das cerrações e a elegância das neblinas.

A história, na sua dimensão factual e pitoresca, ganha espaço singular na pena de Ramalho Leite, político experiente e consolidado pela geografia eleitoral de Borborema e Bananeiras. Seus artigos, sempre curiosos, tocam em pontos essenciais da microhistória, em nódulos e detalhes do cotidiano, em caracteres surpreendentes de certos personagens, na filigrana sinuosa de certos fatos e acontecimentos nem sempre estudados sob a ética do rigor acadêmico.

Ao seu lado, em diagramação paralela, leio os artigos políticos de Rui Leitão, fundados na clareza do pensamento, na objetividade dos conceitos, no ardor e na verdade de sua lógica ideativa e profundamente democrática. Reflexivo, e numa perspectiva eminentemente social, voltada para a defesa dos interesses de setores menos favorecidos, a coluna de Rui tem ar de trincheira, gosto de combate, postura de libelo.

Ainda na seara do artigo, distendendo, no entanto, seu campo de observação, comparece Abelardo Jurema Filho, colunista social dos mais competentes, com seu olhar poliédrico sobre as manifestações culturais, históricas, turísticas, gastronômicas da cidade. Abelardo detém, como poucos, a energia do trabalho, a prioridade da presença, aquela estranha ubiquidade só pertencente aos anjos e aos deuses. Seus textos são simples, leves, informativos e quase sempre eivados de empatia para com as coisas da terra.

E por falar em terra, eis que me surge a cidade de Pilar e alguns fragmentos de memória na pena de Damião Ramos Cavalcanti. As palavras correm, no seu articulismo, retomando paisagens da várzea paraibana. O verde, que foi de Zé Lins; certas tonalidades líricas que se espraiam pelos versos de Augusto, cercado da tristeza e da beleza dos engenhos.

Já no terreno espinhoso da crítica literária, gênero que Fidelino de Figueiredo, em raciocínio alegórico centrado na figura do crítico, vendo-o como “um solitário rochedo vergastado”, por todos os lados, pela fúria das ondas do mar, leio, com cuidado maior, as palavras de José Mário da Silva, Elizabeth Marinheiro e Sérgio de Castro Pinto. Cada um, a seu jeito único de leitor sensível e equipado, divide, conosco, o exercício heurístico de suas viagens livrescas.

Zé Mário explora o gênero sob os imperativos do olhar acadêmico, balizado sempre por referências teóricas dotadas de solidez e pertinência, assim como o percurso da professora Elizabeth, por sua vez, sempre talhado pelo fervor teórico e atento aos mais atuais e inventivos suportes do método interpretativo. Se a linguagem de um não escamoteia o fluxo exuberante dos vocábulos, a linguagem da outra parece primar pelo rigor da terminologia técnica e precisa.

Em Sérgio, condicionado pelo brilho da síntese e pela aragem de uma sensibilidade poética, convivo com o raro encontro do leitor com a literatura, intermediado pelo zelo de uma intimidade com o movimento das palavras somente viável à força dos que se deixam envolver pela rica intuição do estado lírico. A leitura de Sérgio, e seus curtos e inspirados comentários, passa pela pressão enlevada da poesia.

Estes, e outros acadêmicos, em outros órgãos de publicação, tornam a APL uma instituição viva. Uma instituição do passado, mas também do presente.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB