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Poeta, escritor e professor da UFPB. Membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

O título

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publicado em 09/02/2022 ás 06h49

 

“E o título, Dançar com facas?”, indaga-me o repórter.

Antes de lhe responder, faço-lhe as seguintes considerações:

– Tenho obsessão por títulos. O título, se não é tudo, é quase tudo. Salvatore d`Onófrio, estudioso da teoria literária, fala de sua dimensão catafórica, isto é, de suas incidências semânticas. O espaço, o tempo, as circunstâncias, o fato, as pessoas, os motivos, assuntos e temáticas, tudo pode estar embutido na sua formulação, nominal ou fraseológica. Arnaldo Saraiva, especialista em literatura portuguesa, escreveu delicioso e persuasivo livrinho sobre a questão, tocando em vários aspectos que se cristalizam em torno da problemática dos títulos.

De notícias e não notícias faz-se a crônica, eis como o poeta Carlos Drummond de Andrade intitula um de seus livros. Valendo-se do recurso da bricolagem, já fiz um poema apenas juntando alguns títulos de que gosto, quer pelo elemento melódico, quer pela força imagética, resultantes de sua capacidade expressiva. Se quiser conhecê-lo, leitor, leia O livro da agonia e outros poemas.

Ora, meu caro repórter, dançar com facas tem tudo a ver com a elaboração do poema e com a experiência da poesia. Não é somente pelo fato de que o poema pode conter um vigor melopéico, como queria Ezra Pound (foto), ou seja, certa musicalidade inerente aos artefatos verbais na geografia dos versos; não é somente porque a palavra poética é uma palavra com música, no entendimento de Jean-Paul Sartre.

Quero crer que o poeta, na tessitura do poema, participa de uma dança com as palavras, e esta dança – não tenho dúvidas – é uma dança cheia de riscos, armadilhas, desafios e perigos, nem sempre assimilados no ato do fazer poético. Dançar com facas me parece uma boa metáfora para o poema. Quem dança com facas experimenta o sabor da vida na ação lúdica de dançar e se vê diante da morte que se apresenta no gume das facas. É Eros e Tânatos misturados no labor erótico da linguagem.

Por outro lado, só dança com facas quem possui o devido domínio dos instrumentos cortantes e as habilidades necessárias para enfrentar os sortilégios da morte. Não seria o poema, ou melhor, a dança do poema ou o poema∕dança, um encontro entre a vida e a morte?

  1. S. Eliot e José Antonio Assunção, poetas de uma mesma família, agônica e filosófica, falam do poema como de um epitáfio, o que me reforça a imagem dessa dança com facas. Facas – é claro – como metonímia de outros modelos fatais, a exemplo das espadas, dos machados, dos trinchetes, dos facões e dos punhais.

Portanto, escrever o poema, isto é, procurar a poesia no espaço das palavras, é dançar com facas!

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB

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