João Pessoa, 25 de novembro de 2022 | --ºC / --ºC Dólar - Euro
Todos sabem: morrer é como dormir e algo a mais, mas do excedente não se fala, afinal da morte ninguém se levanta e, caso se levante, esquece, como de tudo eu me esqueci naquele sono lindo depois da sedação para o cateterismo.
Se morrer for como aquele pequeno porre anestésico, aplicado pela Dra. Nicole de Castro, eu quero que a morte seja eterna. Nem sonhar a gente sonha. É um divórcio do tempo, um espaço quântico, engolidor da consciência, ausência de tudo, bem melhor do que aqueles lapsos de memória causados pelos porres de uísque.
E a gente gosta. Mentira! A gente nem gosta nem desgosta, porque a morte é assim: asséptica a gostos e desgostos, afinal, ela desconhece as dimensões do tempo; e, caso conheça, é alheia as limitações humanas; se não o for, age com desapego das lembranças e dessa conversa fiada ou desviada nos devaneios de um escritor cateterizado.
Todos deveriam morrer durante uma hora, pelo menos uma vez ao ano. Assim morreríamos e viveríamos melhor. Razão simples: para os glutões, diminuiria o colesterol; para os viciados em trabalho, pouparia a energia do tempo; para os egoístas, o descansar dessa agonia.
E caso tiveres medo da morte, não te afobe. A vida é cheia de novidades, aclives e declives, miudezas, elucubrações, imensidões. Então, relaxa. Faz um cateterismo. A sedação é leve, mas suficiente para te desligar do mundo e voar…
Minto, nem voar a gente voa, apenas se é, ali, estirado em uma maca grandona, um estar sem mal-estar, um ser-não-ser, boiando nas dimensões da inconsciência.
Não há de ter medo. O Dr. Gustavo Rique jamais desvirtuaria o cateter em direção ao teu cóccix, mas o mantém vasculhando o teu coração em busca de algum ruído feio, de uma ferida da vida, de um poema sem pé nem cabeça, de um choro engolido, de um bolor de gordura enfeiando as tuas veias.
Se não souberes o caminhar, começa por Dr. Guilherme Augusto. Ele vai organizar um passo-a-passo para o transe. Ele é bom nisso.
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OPINIÃO - 22/11/2024