João Pessoa, 20 de maio de 2023 | --ºC / --ºC Dólar - Euro

ÚltimaHora
MAISPB ENTREVISTA

Ao MaisPB, Martinho da Vila detalha novo trabalho e fala da relação com a Paraíba

Comentários: 0
publicado em 20/05/2023 ás 11h56
atualizado em 20/05/2023 ás 17h51

Kubitschek Pinheiro

Fotos: Leo Aversa

Foto capa do álbum: Emerson Rocha

Já está em todas as plataformas “Ópera Negra”,  novo álbum de Martinho da Vila – o 51º contando com o songbook. São 12 canções. É um disco de histórias de vidas, com os personagens mais emblemáticos: Exu, Madalena, Iracema, Zumbi dos Palmares, uma mãe solteira  e os heróis da liberdade – e tem mais, a vida e a morte, o amor e a dor.

 Além do mestre Martinho José Ferreira, estão no disco Zé Keti (1921-1999), Mário de Andrade (1893/1945), Adoniran Barbosa (1949/1982), Chico César, Will Kevin,  Renato Teixeira e os filhos Mart’nália, Maira  e Preto, com canções autorais e raras regravações.

 O disco abre com o som da orquestra regida pelo maestro Leonardo Bruno,  num espaço de quatro minutos vem a voz de Martinho da Vila, que diz apenas com suavidade: “Zumbi dos Palmares, Zumbi”. Sim, é Zumbi, que Martinho  chama para iluminar a “Negra Ópera”, o mestre do quilombo.

Ópera Negra” com selo da Sony Music, foi lançado em 13 de maio de 2023 — data em que se celebra o aniversário da Abolição, ou ao menos da primeira Abolição de outras que ainda estão por vir. É  o  Martinho do Brasil que desde “Nem Todo Criolo é Doido”, de 1968, é bamba. O disco retrata as realidades dos territórios do nosso povo. Haja vela!

A “Ópera Negra” de Martinho é também trágica. Sua essência está em quase todas as faixas. Transformada em “ária popular” com “tenor” e “barítono”, tendo ao fundo apenas o violão de Cláudio Jorge, “Acender as velas”, tem uma interpretação arrasadora de Martinho em dueto com o paraibano Chico César.

Fotografia de Leo Aversa
[email protected]

Com as filhas Mart’nália no vocal e Maíra Ferreira em performance sofisticada ao piano, “Malvadeza Durão” (também de Zé Keti) narra história de crime passional no morro, em que “o criminoso ninguém viu”. Zé Keti cantou um dia “eu sou o samba”, que Martinho cita. Mart’nália, porém, tira as aspas e, num signo linguístico, escuta a voz do pai e diz: “o samba é tu”.

Martinho José Ferreira nasceu em Duas Barras, Rio de Janeiro, em 12 de fevereiro de 1938. Filho de lavradores da Fazenda do Cedro Grande, veio para o Rio de Janeiro com apenas 4 anos. Quando se tornou conhecido, voltou a Duas Barras para ser homenageado pela prefeitura em uma festa, e descobriu que a fazenda onde havia nascido estava à venda. Não hesitou em comprá-la e hoje é o lugar que chama de “Meu off-Rio”.

Mil coisas, da música, além da “Ópera Negra”, Martinho conta pra gente, numa conversa exclusiva para o MaisPB

 MaisPB – Martinho, como foi gerado esse disco?

Martinho da Vila – Foi acontecendo. Meus discos são sempre  alegres e como gosto muito de ópera, resolvi fazer a minha e cantar essas canções com certa dramaticidade.

MaisPB – Ficou muito bom, né?

MaisPB – Eu não queria fazer mais disco não, até porque não temos o físico. A gravadora me ligou dizendo que era bom. Eu pensei em fazer uma coisa, com muito ritmo, muitos sons, muitos arranjos. Pensei em fazer algo mais simples e ao mesmo tempo que reflita como é uma opera, a Negra Ópera, a minha ópera.

 MaisPB – As canções estão ligadas, umas nas outras, parecem contos, histórias de muitas vidas…

Martinho da Vila – Exato, é uma sequência. Você vai ouvindo e disco e juntando as cenas.

MaisPB – A sexta faixa “Malvadeza Durão”, de Zé Keti,  tem sua filha Maria, tocando no piano?

Martinho da Vila – É verdade, Maíra deu luz a essa canção que conta a história do Malvadeza de Zé Keti, que gostava muito dele, foi um grande amigo meu, muito talentoso. A música dele mais famosa é “Eu sou o Samba”, mas a que gosto mais é “se a alguém perguntar por mim, diz que fui por aí, com o violão debaixo dos braços…” cantarolou

 MaisPB – Nessa canção, você canta com Mart’nália?

Martinho da Vila – Até brinquei com ela, Malvadeza durão, um cara rude. Durão deve ser de duro, sem dinheiro, Mart’nália canta muito bem e gostei de ter dividido esse momento com ela.

Fotografia de Leo Aversa
[email protected]

MaisPB – A faixa “Linda Madalena”, vem do seu disco “Novas Palavras, de 1983 e agora com novo arranjo…

Martinho da Vila – Essa música eu fiz, devia ter no máximo vinte anos. Eu era da Escola de Samba Aprendiz da Boca do Mato e teve esse dia lá, eu falei dessa canção, que tem uma tristeza, mas na quadra a gente cantava com muita alegria. Eu consegui fazer, queria uma canção que passasse essa emoção da Madalena, do drama que ela passou.

MaisPB – A canção Iracema, é uma declaração de amor?

Martinho da Vila – Pois é, essa é do Adoniram Barbosa, ele era incrível. Eu tentei passar bem essa coisa e talvez essa seja a canção mais dramática do disco.

MaisPB – Vamos falar da canção Timbó, que tem a participação do rapper carioca Will Kevin?

Martinho da Vila – Ele é rapper,  Will Kevin, que o meu produtor teve a ideia de chamar, é da periferia e foi muito interessante, foi ótimo. É bonita, né?  Acho que essa canção foi lançada por Jamelão.  Um samba antigo, que eu conhecia, dei uma lembrada e consegui achar.

 MaisPB  – Essa canção tem uma história “Exú das Sete”,  uma das inéditas desse disco, você canta com seu filho Preto Ferreira?

Martinho da Vila – Na religião católica, que é minha formação, nós temos o anjo da guarda, cada pessoa tem o seu. Já a religião de origem africana, candomblé, umbanda, tem o  Exu. Cada um teu o seu Exu, que corresponde ao anjo da guarda do catolicismo. Preto, meu filho, canta bem e mostra seu Exu.

MaisPB  – Você canta “Acender as velas”,  com Chico César, como aconteceu o convite?

Martinho da Vila – Chico César é talentoso, é fantástico, sempre gostei muito dele e  a gente tinha uma certa amizade, ai um dia o vi dando uma entrevista que falava em mim, vi que ele gostava mais do que eu calculava. Convidei ele, veio ao Rio e gravou, foi incrível ter esse artista paraibano no meu disco. Ele ficou feliz. Eu trambém

MaisPB – Tem o clipe dessa canção, né?

Martinho da Vila – Quando eu falei – vou fazer clipe dessa música, Chico César gritou de lá: “se quiser eu participarei” Fizemos. Dei um abraço grande nele. O clipe ficou uma beleza. Eu falei que maravilha, e fizemos um trabalho bem bonito.

MaisPB – Essa canção “Dois de Ouro” é uma homenagem a capoeira?

Martinho da Vila – É, exato, uma capoeira, essa música eu fiz a pouco, gosto muito dessa canção

MaisPB – Vamos falar da índia Diacuí, a nona faixa?

Martinho da Vila – Isso vem dos Os Irmãos Villas-Bôas, que eram sertanistas e se embrenhavam pela Amazônia para catalogar as tribos, as nações indígenas e, um deles se apaixonou pela índia Diacuí e  a trouxe para o Rio de Janeiro: casaram-se e ela engravidou. Levaram para ela ter filho na tribo, mas acabou morrendo no parto, uma coisa chocante, foi um acontecimento. Eu fiz essa música lá atrás, também. Na época eu vi uma entrevista do Villas Boas contando a história e eu fiz a canção.

MaisPB – Na canção Mãe Solteira de (Wilson Batista e Jorge de Castro) é só voz e contrabaixo?

Martinho da Vila – Sim, é essa canção é muito linda, gosto muito. É uma saga.

MaisPB – Vamos falar da 11ª faixa “A Serra do Rola Moça”, que você musicou um poema de Mário de Andrade?

Martinho da Vila – Eu musiquei e gravei, e tem a participação do Renato Teixeira – foi bom de ter chamado ele, Renato Teixeira, meu eu amigo de muitas dadas e Mário de Andrade, nosso poeta e escritor.

 MaisPB – Quando vai começara temporada de shows?

Martinho da Vila – Vou começar por São Paulo, depois vou fazer uma turnê pela Europa.

MaisPB – Faz tempo que você não canta aqui no Nordeste, na Paraíba?

Martinho da Vila – Esse lugar é maravilhoso, adoro cantar ai. Tenho muitos amigos paraibanos. Um dos grandes parceiros meu, o Zé Catimba é da Paraíba, de Guarabira. E ai só tem coisa boa, tem um mar bonito, tem uma carne de sol, muito boa, né? Como é o nome daquele hotel bonito que fica na beira do mar?

MaisPB – O Hotel Tambaú está abandonado, sabia Martinho?

Martinho da Vila – Esse negócio de perrengues é uma coisa muito ruim. Fechar um hotel daquela natureza, tão bonito. Sabe, eu gosto muito dos paraibanos…

Fotografia de Leo Aversa
[email protected]

Leia Também