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José Nunes da Costa nasceu em 17 de março de 1954, em Serraria-PB, filho de José Pedro da Costa e Angélica Nunes da Costa. Diácono, jornalista, cronista, poeta e romancista, integra a Academia Paraibana de Letras, o Instituto Histórico e Geográfico Paraibano, a União Brasileira de Escritores-Paraíba e a Associação Paraibana de Imprensa. Tem vários livros publicados. Escreveu biografias de personalidades políticas, culturais e religiosas da Paraíba.

O neto, o mar e as estrelas 

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publicado em 29/01/2025 ás 07h00
atualizado em 28/01/2025 ás 19h17
 
 
Foi em uma noite de lua cheia, dessas luas que passeiam preguiçosas pelo céu sem nuvens, que fomos olhar o mar.
O entardecer prometia maré baixa, situação convidativa para contemplar a lua na praia. Na boca-da-noite lá estávamos.
A noite iniciava calma sobre o mar e as ondas da maré eram silenciosas.
Meu neto Bernardo, deitado na areia da praia de Manaíra, braços abertos, olha para o infinito. As pessoas não o observavam, nem contavam as estrelas.
Algumas pessoas caminhavam e observavam o esplendor da maré mansa. Em grande extensão da praia pequenos grupos, sentados na areia fofa, conversavam.
Desprovidos de pressa, desfrutamos de um pedaço do luar na praia.
Olho uma mulher negra. Ela é jovem, alta, está descalça, de cabelos ondeados, vestida com short e blusa brancos que caminha lenta pela areia. Entra na água. As ondas estão abaixo dos joelhos. Ela segura o buquê de flores brancas com as duas mãos.  As rosas perfumaram as águas do mar.
Parece murmurar alguma coisa ao erguer o buquê de rosas quando uma onda mais forte chega aos joelhos.  Espera um pouco mais, então, com força, joga a oferenda ao mar. Permanece olhando sua oferta a Iemanjá, depois  sai apressada pela areia e se perde na distância.
Enquanto realizava sua oblação, sua roupa refletia o brilho da Lua, igualmente como acontecia na água do mar. Mesmo reflexo se observava nas vestes brancas de Bernardo, enquanto contava estrelas.
A moça, com suas oferendas, e Bernardo, com seus sonhos infantis, protagonizaram as cenas mais belas e puras daquela boca-da-noite de verão.
– O que estás fazendo espichado na areia, menino?
Indaga a mãe que, a poucos metros, molhava os pés na água norma de Manaíra.
O menino fez de conta que não ouvia, e continuou como estava.
Como a mãe chegasse mais perto, repetisse a pergunta, ele falou sem mudar de posição.
– Estou contando as estrelas!
– As marmotas do avô – falou a avó, que também estava por perto.
Nesse momento a moça das flores havia jogado o buquê de rosas ao mar.
Fiquei com a imagem da moça erguendo os braços em louvação e oração a Iemanjá, na sua crença, certamente agradecendo a rainha do mar pelo rapaz que encontrou ou pela bonança de bênçãos celestiais. As rosas ficaram boiando sobre a água e, nesse instante, não comentei com ninguém, mas era como se o vento rodopiasse no lugar onde estávamos. O mar tem muitos mistérios.
Continuei a observar o neto na sua conversa com o Cosmos. Nas estrelas ele talvez tenha observado as pétalas das rosas brancas que voltaram à beira-mar.
Nas noites de lua cheia, no sítio onde me criei, dava vontade de andar pelas estradas de minha terra onde o luar é brilhoso em toda a extensão da vegetação.
O mar à frente, na noite silenciosa, fazia recordar os imensos partidos de cana pendoados em Serraria, refletindo os raios da lua.
Chegando em casa, lembrei de uma crônica de Rubens Braga em que descreve semelhante cena da moça em Copacabana, que joga oferendas ao mar. Isso se deu no ano de 1952, quando uma mulher negra fez doação ao mar de um ramalhete de rosas ainda desabrochando. Quando a moça foi embora, ele entrou na água e recolheu duas rosas, uma que estava aberta e outra em botão, e as guardou na sua casa em um jarro com água.
Como aconteceu em Copacabana, também uma leve camada de espumas se formou ao seu redor da moça da praia de Maneira, como repetindo semelhante chuva de rosas brancas, assim como descreveu o cronista capixaba.

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