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Paraibano da Capital. Tocador de violão e saxofone, tenta dominar o contrabaixo e mantém, por pura teimosia, longa convivência com a percussão, pandeiro, zabumba e triângulo. Escritor, jornalista e magistrado da área criminal do Tribunal de Justiça da Paraíba.

      Velhacaria

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publicado em 31/01/2025 ás 13h12
Two strong cards in the sleeve of the fraudster

Dever nunca é uma boa ideia. Ao menos, para quem tem vergonha na cara. Deve-se fugir de empréstimos pessoais, consignados, parcelas altas de cartão de crédito – o pior negócio do mercado – , notas promissórias, cheques pré-datados (ainda existem?), prestações , e todo o resto do arsenal de  armadilhas, como o diabo foge da cruz.

Pior do que essas modalidades de dívida, só mesmo a tal da agiotagem, por sinal, prática delituosa. Quem entra na mão de agiotas se vê em maus lençóis. Os juros são extorsivos, a dívida vira bola de neve, e a inadimplência é resolvida até de forma violenta. Bom mesmo é passar ao largo.

Há, entretanto, quem não se importe em dever ao mundo inteiro. Ao contrário, vive muito bem assim, feliz da vida, absolutamente indiferente ao capital que deveria pagar, e não paga. São os adeptos da antiga arte da velhacaria. Sim, ser velhaco é um tipo de arte. É preciso desenvolver algumas “qualidades” e “dons” para ser um velhaco respeitável.

Primeiro, é preciso ter cara de pau , daquelas que obrigam o portador a lavar o rosto com Óleo de Peroba. Precisa estar sempre à vontade na presença dos credores, e até pedir mais dinheiro a  quem já deve muito.

Depois, é necessário ir anestesiando a consciência, se tornar insensível ao mal que está causando aos amigos, parentes, colegas de trabalho , e demais infelizes vítimas das “facadas” que sai desferindo. Não se comover com a falta que aquele valor está fazendo nas contas do  outro. Ele que se lasque prá lá. Emprestou porque quis.

Por  fim, precisa ter poder de convencimento aguçado. Uma boa lábia. É preciso convencer a vítima a emprestar, mesmo que ela saiba que dificilmente vai reaver a quantia. Não é para qualquer um.

Conheci alguns velhacos notórios ao longo da vida. Fui até vítima de um deles, mesmo me cercando de todos os cuidados. Não foi empréstimo direto, mas, um aval perante o velho Paraiban .  Mesmo sabendo que a figura era costumeiramente inadimplente, fui ao balcão do gerente e avalizei o empréstimo, convencido pela conversa do sujeito: necessidade urgente, questão de saúde, era coisa rápida, em pouco tempo saldaria, etc. O resultado não podia ser diferente. Paguei. Até hoje não vi a cor do dinheiro. O “amigo” até já partiu dessa para melhor.

O pior tipo , entretanto, é aquele que fica com raiva quando é cobrado. Fecha a cara, responde grosseiramente, corta o assunto. Monteiro Lobato, no conto “O engraçado arrependido” , que compõe o livro URUPÊS, bem definiu este tipo. O vendeiro da vila  queixava-se do Pontes, que muito lhe devia, mas, ao menos, o fazia rir. Segundo ele, ruim era o Major Carapuça que “dava calote de carranca armada” .

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