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Poeta, escritor e professor da UFPB. Membro da Academia Paraibana de Letras. E-mail: [email protected]

Pereira da Silva e um novo leitor

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publicado em 19/03/2025 ás 07h00
atualizado em 18/03/2025 ás 18h26
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Pereira da Silva (1876-1944) foi primeiro paraibano a ocupar uma cadeira na ABL – Academia Brasileira de Letras. Poeta simbolista, à sua época reconhecido e consagrado, tanto pelos rodapés da crítica jornalística quanto pelos manuais de história literária, ensaios exegéticos e antologias. Notáveis da vida literária, seus contemporâneos, escreveram páginas elogiosas acerca de sua poética melancólica, marcada, sobretudo, por uma rara e rigorosa unidade temática e expressiva.

Agripino Grieco, Humberto de Campos, Adelmar Tavares, Peregrino Júnior, Andrade Muricy, Massaud Moisés, Péricles Eugênio da Silva Ramos, João Lyra Filho, Alcides Carneiro, Humberto Mello, Humberto Fonseca de Lucena e Gilsa Elaine Ribeiro Andrade, entre outros nomes, já rastrearam os meandros sombrios de sua vida e de sua dicção lírica, contribuindo, assim, para a análise, a interpretação e a apreciação crítica do solitário autor de Vae Soli (1903).

Rogério de Meneses Fialho Moreira, também filho de Araruna, vem se associar a esta linhagem de estudos em torno de seu ilustre conterrâneo, com o opúsculo, O esquecido poeta Pereira da Silva – primeiro paraibano na Academia Brasileira de letras, ora publicado.

Dividido em seis capítulos, o trabalho procura abordar “O difícil começo”, “O início da ascensão” e a presença do poeta na ABL, assim como algumas razões para o seu esquecimento e a vertente simbolista de sua poesia.

Atento a certas incertezas de caráter biográfico, a exemplo da data de nascimento do poeta, o nominativo verdadeiro da esposa e o problema criado em torno de seu próprio nome, confundido com o de outras personalidades do mundo literário, Rogério Fialho dirime dúvidas e estabelece a veracidade acerca dos fatos e fenômenos que analisa. Para tal, socorre-se da pesquisa minudente em fontes primárias, pesando e medindo a validade de documentos antigos, como batistérios, certidões de casamento, atestados de óbito e outros materiais de força probatória que possam garantir a fidedignidade das informações.

Sua primeira infância em Araruna, seus anos no Rio de Janeiro, sua temporada em Curitiba são percorridos e sondados, principalmente naqueles aspectos que concernem, em especial, à sua trajetória literária, destacando-se, aqui, o vínculo, cultivado na capital paranaense, com o poeta simbolista Dario Veloso, por quem nutriu grande admiração por toda vida.

No âmbito das fontes bibliográficas compulsadas pelo pesquisador, são relevados os discursos de Adelmar Tavares, Peregrino Júnior, João Lyra Filho e Alcides Carneiro, como incursões indispensáveis à introdução do leitor na obra e na vida de Pereira da Silva. A estes, devem se juntar as palavras críticas de historiadores da literatura, como Massaud Moises, Péricles Eugênio da Silva Ramos e Andrade Muricy, assim como as invectivas heurísticas de um Agripino Grieco, Humberto de Campos e Antônio Carlos Sechin.

Este zelo particular com as fontes me parece um dos pontos positivos do esforço empreendido por Rogério Fialho. Em pesquisa biográfica, a verdade dos fatos é imperativo categórico, e o esclarecimento sobre as dificuldades da pesquisa e a validade da documentação funcionam como condutores morais de uma possível e necessária ética da informação.

Por outro lado, devo chamar a atenção para o fato de que, alicerçado em sua capacidade de pesquisa e no senso de organização demonstrado, Rogério Fialho procura se ater àquilo que lhe parece essencial, sobremaneira quanto aos elementos biográficos, não se imiscuindo, como um livre atirador, na seara mais espinhosa e específica da crítica literária.

Digo isto em função, sobretudo, dos capítulos quarto e quinto, nos quais procura investigar as razões do esquecimento de que é vítima o poeta, mormente pelas novas gerações, e quando traça alguns roteiros, aqui, calcado nos especialistas da crítica literária, para a configuração do simbolismo na poesia de Pereira da Silva. Conta, neste passo, a transcrição integral de alguns poemas do bardo paraibano, permitindo, assim, ao leitor ter acesso ao discurso expressivo e ao universo sentimental e ideativo do autor de O pó das sandálias (1923). Sem dúvidas, um dos poetas simbolista mais uniforme e homogêneo em termos de cristalização estilística.

Importante também o acervo iconográfico, fotos e capas das edições originais dos livros, a complementar esse passeio biográfico, imprescindível como fonte de estudo e como nota propedêutica para uma leitura mais cerrada e mais completa da poesia de Pereira da Silva.

Quer na dimensão das letras locais, quer no espaço mais amplo das letras brasileiras, trabalhos como este, voltados para o resgate de valores literários, com espírito de correção histórica, com a possibilidade de abrir escaninhos cognitivos para novas pesquisas, devem ser reconhecidos e louvados. Até porque, o pouco que se faça, num campo onde não se fez quase nada, já é muito.

* Os textos dos colunistas e blogueiros não refletem, necessariamente, a opinião do Portal MaisPB